ABRI OS OLHOS E ABANDONEI O ESPIRITISMO


O texto a seguir é um longo relato que deve ser lido, pacientemente, até o fim. É um relato doloroso, realista e vai contra crenças, fantasias e fundamentalismos que permanecem nos corações e mentes de um considerável número de pessoas. Daí que, para aqueles que se apegam a essas ilusões, por elas lhes serem confortáveis e de acordo com o que entendem como "fé cristã", seria melhor não ler este texto.

30 de março de 2012. Nesta data, depois de 28 anos, eu rompi, definitivamente, com uma religião que, infelizmente, nove entre dez pessoas consideram como confiável, avançada e agradável, mas que se revela, nos bastidores, uma grande e vergonhosa farsa que só trouxe problemas para minha vida pessoal. Essa religião é o Espiritismo brasileiro.

Quem acha que são as seitas ditas "evangélicas", de tendência neopentecostal, como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus, errou. Evidentemente, religiões desse nível, que se baseiam na ganância de "pastores" e "bispos", a se enriquecerem usurpando o dinheiro dos fiéis e se promovem através de ideias absolutamente retrógradas, são extremamente deploráveis, sobretudo porque estão a serviço do ódio e de fantasias como o terraplanismo e um certo desprezo cínico à gravidade da Covid-19.

No entanto, nada se compara ao que, aqui no Brasil, se entende como Espiritismo, que surgiu rompendo com as ideias lógicas de Allan Kardec, preferindo a deturpação de Jean-Baptiste Roustaing, que pavimentou o caminho que se adota até hoje, com igrejismo dissimulado, mas claramente herdeiro do Catolicismo jesuíta que era a religião brasileira durante seus primeiros séculos, na condição de Brasil-colônia. Esse Catolicismo jesuíta é de origem portuguesa e o Catolicismo português teve essência profundamente medieval, mesmo já nos primórdios da Revolução Industrial.

Isso é típico no Brasil, quando novidades são parcialmente acolhidas mas sempre adaptadas a algum fenômeno pré-moderno. O "novo" sempre é introduzido mediante o acordo com o "velho". Esse é um cacoete muito comum em nosso país, onde coisas inovadoras, em vez de romperem com o que há de antiquado ou obsoleto, precisam se adaptar a estes, para terem algum êxito entre os brasileiros comuns.

Por isso, o Espiritismo foi introduzido no Brasil fugindo das lições do professor que, em vida, era conhecido como Leon Hippolyte Denizard Rivail. Este foi um pedagogo de Lyon, na França, discípulo do educador suíço Johann Heinrich Pestalozzi e estudioso das experiências do pesquisador alemão do Magnetismo, Franz Anton Mesmer. Kardec também agia impulsionado pelas influências que o Iluminismo francês exerceu em várias esferas do Conhecimento.

Em vez disso, o que se conhece como Espiritismo brasileiro, na prática, tornou-se um engodo igrejeiro da pior espécie, que costumo chamar de "Catolicismo medieval de botox", um "medievalismo" apenas flexível que serve de "muletas" para os "pés" que os brasileiros amputaram da doutrina original.

Afinal, na prática o Espiritismo é quando o Catolicismo medieval entra em acordo com o ocultismo existente na Idade Média, que forneceu a esse medievalismo católico repaginado concessões que incluem curandeirismo místico e ações comparáveis às bruxarias e ao esoterismo cármico.

Sou de uma família que segue o Espiritismo. Tanto de parte de mãe, trazida pela comadre de minha mãe (madrinha da filha da amiga), quanto por parte de pai, por conta de uma irmã, tia minha. Meus pais manifestaram-se "espíritas" (à moda brasileira) quando eu tinha cinco anos de idade, em 1976. Mas me considerei um "espírita" somente a partir de 1984.

Eu era devoto desse Espiritismo, mas isso nada me ajudou a melhorar de vida. Pelo contrário. Era como se eu, citando a metáfora bíblica, pedisse pão e o Espiritismo brasileiro me desse serpente. Tive situações de profundo azar, que se tornaram piores quando eu fazia os chamados "tratamentos espirituais". E isso sob o preço de pagar transportes para lugares distantes (mais de um ônibus), gastar dinheiro com lanche e até longa espera (no bairro de Uruguai, em Salvador) para pegar o último de um dos ônibus que me deixaria num outro ponto para pegar um outro ônibus para casa.

Abandonei a religião depois que tive incidentes pessoais muito graves, envolvendo valentonismo digital (cyberbullying) que beirava a ser presencial. Mas, ao longo desses 28 anos, tive adversidades sem controle, não podia decidir pelo meu destino, mesmo se me sacrificasse por isso. Mesmo que eu desse murros em pontas de faca, as oportunidades que gostaria de conquistar me fugiam das mãos, enquanto oportunidades indesejáveis (não seriam "inoportunidades"?) chegavam ao meu caminho, às vezes com certa insistência. Não tinha espaço para exercer plenamente a minha individualidade.

Eu estranhava isso quando, envolvido com o Espiritismo brasileiro, eu sempre contraía azar, situações de mau agouro, com adversidades chegando sem controle e sem que eu pudesse agir para combatê-las. Eu até errei muito na vida, mas, ao recorrer ao Espiritismo brasileiro, em vez de me levantar, me empurravam para a beira do abismo. O Espiritismo brasileiro me fazia me expor às influências energéticas negativas. Quando estava fora do Espiritismo, as energias me eram melhores.

A partir de 2012, andei pesquisando muito a respeito e enviei até sugestões para páginas que contestam o Espiritismo que aqui se tem. E as constatações são muito chocantes e realistas, tanto que muita gente, ainda enfeitiçada pelas fantasias mistificadoras do "nosso Espiritismo" e o "canto de sereia" dos chamados "médiuns", se recusa a admitir essa realidade. Preferem se afogarem nos oceanos mistificadores dos "bondosos médiuns" do que tirar esse véu de ilusão.

É curioso considerar que os piores "cantos de sereia" não partem de mocinhas bonitas e jovens com belas vozes e cuja metade do corpo é um enorme rabo-de-peixe, mas de velhinhos feiosos e desengonçados, que de maneira assustadora exercem um domínio traiçoeiro e macabro sobre multidões, sendo vistos como "espíritos de luz" quando a verdade se tornam o contrário.

Certas páginas da Internet alertam sobre a farsa de um terrível arrivista, chamado Francisco Cândido Xavier e apelidado Chico Xavier. Não menciono o nome dele nos blogues porque traz mau agouro, o Espiritismo brasileiro é uma religião muito perigosa, pelas razões de que ela já nasceu deturpada, divorciada dos ensinamentos originais, e se projetou através de práticas bastante desonestas.

Li certa vez que a vida de Chico Xavier daria um filme do Monty Python. Se observarmos bem os pormenores dessa vida, o enredo é terrivelmente assustador e deplorável: um pequeno servidor que se promove com uma literatura fake e, de arrivismo em arrivismo - que inclui uma morte suspeita do sobrinho Amauri - , passou a ser considerado, pelos artifícios discursivos da ditadura militar, um "símbolo de paz, fraternidade e caridade".

Sobre Amauri Xavier, o sobrinho do suposto médium ameaçou denunciar as fraudes do tio, que já renderam um processo judicial. A revista Manchete já relatou que Amauri recebia ameaças de morte do "meio espírita", o que contraria o mito de que os "espíritas" nunca manifestam qualquer tipo de ódio e dizem apreciar os inimigos e opositores "com carinho, consideração e misericórdia".

Chico Xavier foi uma espécie de Jair Bolsonaro do Cristianismo que começou causando tantos escândalos quanto aquele que hoje (des)governa o Brasil (e que seria apoiado, com gosto e fervor, pelo próprio "médium", se este ainda estivesse "encarnado"). Seus primeiros livros literários, supostamente creditados aos "escritores do além", são uma grande farsa que é facilmente notada por quem tem um mínimo de conhecimento literário, afinal, as "psicografias" sempre fogem dos estilos originais dos autores mortos alegados.

É como disse, em matéria da revista Realidade sobre o "médium", lançada em novembro de 1971, o jornalista Léo Gilson Ribeiro, mais tarde um dos fundadores de Caros Amigos, ironizou a respeito das "psicografias" que nunca ficam à altura do que os grandes escritores fizeram em vida: "O espírito sobe, o talento desce".

O primeiro livro de Xavier teve o título de Parnaso de Além-Túmulo. Foi lançado originalmente em 1932 e é um pioneiro da literatura fake. O título já remetia a coisa antiquada, pois o Parnasianismo já era um movimento literário obsoleto, enquanto, por outro lado, o Modernismo se tornou mainstream e seus artistas já conquistavam até mesmo cargos públicos, como o famoso Mário de Andrade.

Curiosamente, porém, no livro Parnaso de Além-Túmulo predominam pastiches de poetas do Romantismo e Simbolismo, em expressões completamente muito estranhas. A pouco conhecida poetisa potiguar Auta de Souza aparecia em poemas que nada lembravam o estilo feminino-juvenil da moça, que morreu muito cedo. Tinha o estilo masculino do "médium".

Da mesma forma, Olavo Bilac era associado a uma poesia abaixo do seu talento original. Pude conferir isso quando a Internet me apresentou, para comparação, poemas originais e "mediúnicos". Com base na musicalidade dos versos originais de Bilac, tentei mentalmente recitar os poemas "mediúnicos", e não vi um pingo do ritmo dos versos bilaquianos, mas versos cansativos e muito mal organizados, além da temática ridícula da tal "Pátria do Evangelho", que explicarei depois.

E o Casimiro de Abreu, associado a um poema no qual o suposto espírito parece ter "alegria em sofrer"? Isso mais parece uma galhofa com os próprios ultrarromânticos, uma vez que o Ultraromantismo - tendência literária que marcou o final de minha adolescência - via o sofrimento não como um prazer ou alegria, mas como um lamento, que era dramaticamente expresso em versos e na vida melancólica dos seus poetas, como Casimiro, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela e Junqueira Freire, que com mais de um século de antecipação, era o "Ian Curtis baiano".

Li também os livros de Humberto de Campos, que teve uma sina digna de uma obra surreal. Ele era um consagrado escritor maranhense, membro da Academia Brasileira de Letras, e seu estilo, embora definido como "neo-parnasianismo", era quase modernista, com sua narrativa ágil e dinâmica, frequentemente marcada por um senso de humor refinado, mas às vezes hilário, como hilário foi o saudoso Paulo Henrique Amorim, filho do espírita anti-igrejista Deolindo Amorim, no Conversa Afiada, conforme pude conferir nos últimos vídeos do "ansioso blogueiro".

Aí, Humberto de Campos lançou um artigo em duas partes analisando o tal Parnaso de Chico Xavier. Também li esse artigo publicado na Internet. Embora fingisse acreditar na "veracidade" das "psicografias", com uma linguagem que sugere uma sutil ironia, Humberto desaconselhou o então jovem mineiro a investir em trabalhos desse porte, para não comprometer o ganha-pão dos escritores vivos, mediante o apelo sensacionalista das obras "do além-túmulo".

Embora não haja dados oficiais que constatem isso, é bem provável que Chico não gostou do artigo e ficou irritado com a falta de reconhecimento de um membro da ABL. A chamada Federação Espírita Brasileira (FEB) demonstra ser uma corporação de intelectuais frustrados e católicos enrustidos. As fotos coletivas mais antigas da FEB mostram seus membros imitando as poses e os trejeitos dos integrantes da ABL.

Indignado, o suposto médium viu uma oportunidade de se vingar quando o escritor maranhense, com 48 anos de idade - uma a menos da minha idade atual - , adoeceu gravemente e morreu. O "médium" teria esperado a "poeira" se assentar para iniciar a suposta parceria, que ele solicitou à FEB usando um sonho (?!) como desculpa. Sim, é o mesmo "médium" que, através de um sonho de 1969, previu uma "data-limite" que tornou-se um vergonhoso fiasco no ano passado, não bastasse o fato de que prever "datas determinadas" é uma prática reprovada por Allan Kardec.

Nesse suposto sonho - não existe garantia de que sonhos desse tipo tenham realmente acontecido - , Chico teria visto à sua frente uma multidão, da qual teria se destacado o escritor maranhense que fez a célebre pergunta: "Você é o menino do Parnaso? Prazer, sou Humberto de Campos".

Começou então a fraudulenta "parceria". Li também os livros "mediúnicos" creditados a Humberto e eles nem de longe lembram o estilo original do autor. A narrativa do "espírito Humberto de Campos" é mais pachorrenta, seus textos muito maçantes e chatos de ler, têm um tom deprimente e são praticamente monotemáticos, oscilando entre assuntos bíblicos e episódios de moralismo religioso, em um deles narrando uma suposta Marilyn Monroe (?!) prisioneira do seu próprio túmulo (?!?!?!).

Humberto de Campos também teve seu nome usado para um terrível livro "patriótico", desses que deixariam os bolsonaristas maravilhados: Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, título que lembra muito o lema de Jair Bolsonaro, "Brasil, acima de tudo, Deus, acima de todos", como se esta fosse uma tradução mais simplória do que aquela. O que, no fundo, é a mais pura verdade.

Este livro, lançado em 1938 mediante um acordo entre o diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), o fascista Lourival Fontes, e a FEB, visando evitar as repressões policiais nos "centros espíritas", tem a narrativa da História do Brasil comparável aos piores livros didáticos, com uma linguagem ufanista que faz do livro "mediúnico" uma vergonhosa patriotada literária.

Infelizmente, as esquerdas brasileiras se iludiram com Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, achando que seria um projeto progressista comandado pela religião "espírita", acreditando na fantasia de que, neste caso, a fusão entre Estado e Religião, que normalmente gera tiranias sanguinárias, traria uma exceção mais "fraterna" e "pacifista", com divergentes e hereges acolhidos como "fervorosos irmãos". Quanta ingenuidade!

Sendo calcado no Catolicismo medieval - tanto que Chico Xavier tem como "mentor" um padre jesuíta, o reacionário e perverso Manuel da Nóbrega, renomeado Emmanuel - e adotando um moralismo punitivista, que culpabiliza as vítimas e atribui as desgraças por elas sofridas como "reajustes espirituais de dívidas passadas", o "nosso Espiritismo" é o primeiro a promover o holocausto, arrumando justificativas para banhos de sangue dos mais terríveis que durariam séculos!

Junte um país mandando no mundo. Não é porque o Brasil é nosso país que vamos deixar que ele se torne um novo Império Romano e exerça um poder totalitário no mundo, calcado numa religião que também exerceria uma perigosa supremacia, mesmo quando sabemos que a ambição do Espiritismo brasileiro segue a linha do "sem querer, querendo", de fingir despretensão mas, em dado momento, arrogantemente prenunciar que "um dia, todos seremos espíritas".

É extremamente constrangedor. Ainda mais quando o "caso Humberto de Campos" terminou "em pizza". A coitada da viúva, Catarina Vergolino de Campos, conhecida como "dona Paquita", e seus filhos Henrique, Humberto e Maria de Lourdes, foram processar o arrivista Chico Xavier e a FEB e só foram cautelosos demais na petição jurídica: pedir aos juízes analisarem as "psicografias" sob o nome do falecido autor. Se fosse confirmada fraude, os herdeiros seriam indenizados. Se fosse confirmada autenticidade, "médium" e FEB teriam que pagar os herdeiros pelos direitos autorais.

Por sorte, um juiz suplente - como, recentemente, tivemos suplentes como Carolina Lebbos e Gabriela Hardt no caso de Lula - , chamado João Frederico Mourão Russell, depois festejado jurista carioca, não entendeu bem o assunto e determinou empate jurídico, julgando a ação "improcedente" e ainda botando na conta de Catarina os custos advocatícios, coisa que daria água na boca nos golpistas que inseriram essa cobrança nos processos judiciais previstos pela reforma trabalhista.

Foi em 1944 e João Frederico antecipou a pior seletividade jurídica que vemos em pessoas como Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. Está na cara que as "psicografias" creditadas a Humberto de Campos eram uma farsa, e não foram poucas as advertências dadas pelos mais renomados e competentes literatos, sobretudo apresentando provas contundentes de disparidades entre os estilos "mediúnico" e original.

No entanto, o prestígio religioso de Chico Xavier, que se compara ao de um magnata ou famoso, garantiu a impunidade. A Justiça seletiva que aqui temos abriu precedente ao inocentar, por empate técnico, um "médium" só porque o processo judicial, tratado como um desperdício, não chegou a conclusão alguma.

A farsa se sustentou ainda quando Chico Xavier seduziu, em 1957, o filho homônimo de Humberto de Campos, o profissional de TV Humberto de Campos Filho, através de uma perigosíssima técnica de manipulação e domínio das pessoas, o "bombardeio de amor", uma espécie de "hipnose afetiva". Graças a isso, Humberto Filho de cético passou a crédulo, caindo no ridículo em louvar e exaltar, até mesmo nos anos 1990, um farsante que usurpou a memória do seu pai.

É sempre assim. As supostas psicografias "não são verdadeiras nem falsas". É uma verdadeira galhofa com a memória dos mortos, que permite que um número "seleto" de homens e mulheres daqui da Terra usurpem os mortos que quiserem, inserindo nas obras fake mensagens cristãs para abafar qualquer risco de denúncia ou investigação, qualquer rastro de suspeita. Pois, segundo a "tradição" da nossa sociedade, ninguém vai processar, denunciar nem investigar obras com "mensagens lindas e consoladoras".

Vale mencionar a covardia do acadêmico e xará meu, Alexandre Caroli Rocha, que disse "não ser possível" rejeitar nem confirmar a "psicografia" que carrega o nome de "Humberto de Campos". Segundo ele, não se pode ser taxativo, sob o risco de adotar conclusões "escorregadias". Só que o infeliz homônimo escorregou, caiu e se machucou, como quem patina sobre o gelo.

No caso de Jair Presente, um outro caso de suposta psicografia, cujo nome remete a um jovem engenheiro e universitário paulista que morreu afogado, em 1974, Caroli Rocha, conforme constam as páginas na Internet, cometeu uma contradição. Ele foi "taxativo" ao dizer que as "cartas mediúnicas" atribuídas a Jair Presente "são autênticas", mas foi "escorregadio" ao dizer que a tese "não garante que as obras tenham sido escritas ou ditadas por alguém morto".

Mas isso é costume de nossas elites acadêmicas, que comandam a máquina burocrática dos cursos de pós-graduação, e que conheço através de teses absurdas que passam pano na degradação cultural do Brasil, entregue a uma bregalização patrocinada por latifundiários, deputados golpistas e barões da grande mídia.

O senso crítico é discriminado, vítima de preconceito movido pelas elites intelectuais que se gabam "desprovidas de todo tipo de preconceito". Isso porque, infelizmente, exercer o senso crítico, para nossa intelligentzia, é confundido com manifestar opinião. Daí que as teses acadêmicas viram coisa de flanelinha, passando pano em "problemáticas" cujas monografias praticamente as desproblematizam, criando uma "naturalidade" e uma aceitação em níveis de "gado bovino".

Livros inteiros seriam necessários para mostrar as fraudes de Chico Xavier. Ele, com toda a certeza, não fazia suas "psicografias" sozinho. Ele tinha uma equipe por trás, desde consultores literários como Manuel Quintão, Luís da Costa Porto Carreiro Neto e o próprio "padrinho" do "médium", Antônio Wantuil de Freitas, até redatores que ajudavam a escrever os livros.

Apesar dessa equipe, Chico Xavier não pode de forma alguma ser inocentado, pois sua participação e seu consentimento, sobretudo nas estranhas alterações editoriais (incluir poemas novos, eliminar poemas problemáticos, inserir novos poetas, alterar alguns poemas e prosas existentes), que ocorreram cinco vezes em 23 anos.

Alguém, em sã consciência, daria autenticidade ou algo próximo a isso a um livro de literatura fake como Parnaso de Além-Túmulo? Como uma obra que, em tese, se pressupõe ser um relato acabado de "mensagens edificantes", tenha que ser remendado, reparado pelos homens da Terra com o consentimento do próprio Chico Xavier, que reclamou de um verso que lhe incomodava muito.

Através de um "fogo amigo" trazido por Suely Caldas Schubert, em Testemunhos de Chico Xavier, o "médium" foi, acidentalmente, desmascarado, quando se divulgou uma carta em que ele agradecia Wantuil e Porto Carreiro pela revisão dos manuscritos "mediúnicos" para a sexta e última edição de Parnaso. Chico dizia que "não tinha tempo para revisar minuciosamente os originais do livro".

Não é o único "fogo amigo". Chico Xavier, que em muitos momentos, era acusado de apoiar fraudes de materialização - ele teria arriscado a "psicofonia", de que, suspeita-se, teria sido uma farsa na qual o "médium" dublava vozes em off de outros locutores, que faziam supostas vozes de espíritos mortos - , foi cúmplice das fraudes de Otília Diogo, conforme provam as fotos do fotógrafo designado para tais eventos, Nedyr Mendes da Rocha, que mostram o "médium" acompanhando os bastidores, como se fosse um dos organizadores do espetáculo ilusionista da farsante.

Otília virou noticiário nacional por ter se fantasiado de "Irmã Josefa" e outros personagens. A "Irmã Josefa" tinha o rosto coberto por um véu e, supostamente, era capaz de atravessar as grades de uma jaula.

O espetáculo ilusionista tinha técnicas de ilusionismo circense, coisa que Chico Xavier apreciava e da qual pôde aprender técnicas de hipnotismo e de influenciar pessoas manipulando corações e mentes. Foi desmascarada pelos repórteres de O Cruzeiro, em 1970, que encontraram o material usado para a fraude. Chico, cúmplice, saiu de fininho, como seu futuro fã Aécio Neves em denúncias de corrupção.

Daí que Chico Xavier conseguiu obter a confiança daqueles que não lha mereciam. Assediou Humberto de Campos Filho que preferiu se submeter ao misticismo religioso do seu assediador, em vez de zelar corretamente pela memória do seu pai.

Mas Chico também assediou o viúvo de uma jovem professora de Belo Horizonte, Irma de Castro Rocha, conhecida pelo apelido de "Meimei" ("noiva querida", se não me engano, em chinês), Arnaldo Rocha. Irma faleceu aos 24 anos, em 1946, tendo sofrido de nefrite crônica, uma grave doença definida pela inflamação nos rins.

Arnaldo, comovido pela perda, foi assediado por Chico Xavier, que decidiu usar o apelido da jovem esposa para produzir obras supostamente educacionais, e o viúvo não só se deixou cair na armadilha como foi parceiro e amigo, iludido de maneira doentia até o fim da vida. Muito perigoso esse "canto de sereia" do feioso "médium".

Assustador também foi o modo com que o sobrinho Amauri Xavier, que era forçado a seguir a mesma carreira do tio, a de produzir literatura fake, morreu. Foi de forma suspeita. Ele denunciou o tio em 1958. A revista Manchete noticiou o caso e relatou que o jovem sofria ameaças de morte.

De repente Amauri (cujo único vício era o de beber muito) foi alvo de uma campanha difamatória do "meio espírita", foi internado num sanatório onde suspeita-se tenha sido agredido e, liberado, foi assediado por um falso amigo que, convidando-o a beber, ingeriu veneno que matou o rapaz, em 1961. Foi uma hepatite tóxica que fez Amauri morrer jovem demais até para a média dos óbitos precoces do alcoolismo, que geralmente ceifam vidas a partir dos 45 anos. Amauri morreu aos 28.

Chico Xavier também foi conhecido pelo lado reacionário. Suas ideias retrógradas tinham efeito doutrinário, pois estavam presentes em seus livros e depoimentos. Há, na Internet, textos que confirmam isso, sinalizando o "médium" aos padrões de uma direita ideológica quase extremista, mas sem chegar a ser abertamente fascista, pelo menos em tese.

O "médium" defendeu o golpe civil-militar de 1964, manifestou repúdio enérgico aos movimentos operário, camponês e sem-teto. Acusou pessoas humildes vitimadas pelo trágico incêndio num circo em Niterói, de 1961, de terem sido "romanos gauleses sanguinários", sem fazer fundamento teórico algum e, para se livrar de acusações contra seu juízo de valor, ainda botou na conta de Humberto de Campos. Nem Al Capone seria capaz de tamanhas atrocidades, o juízo de valor perverso contra pessoas pobres e o falso testemunho de jogar a responsabilidade a outrem.

Chico Xavier era bolsonarista em quase tudo, só excetuando a apologia ao armamento. Até as acusações de supostos problemas psicológicos de cada um se coincidem. O "médium" foi homenageado pela Escola Superior de Guerra, fato que deveria chamar a atenção de todos. Afinal, a ESG não perderia tempo homenageando quem não trouxe uma colaboração valiosa e fidedigna à ditadura militar. Consta-se que as "cartas mediúnicas" foram um artifício para forçar a opinião pública a, através da espetacularização das mortes prematuras, se preparar para aceitar as mortes dos presos e torturados da ditadura militar.

Na obra de Chico Xavier, há ecos de reforma trabalhista: apologia ao trabalho servil e exaustivo, defesa de negociações que privilegiem o patronato, defesa das perdas salariais e fim dos encargos trabalhistas, fim da aposentadoria. Há também ecos de Escola Sem Partido - restrição da Educação para o ensino de leitura, escrita, profissão e religião - e de "cura gay" (suposto respeito à causa LGBTQ, mas atribuindo-a a "confusão mental" do espírito que encarna no sexo oposto ao da vida anterior, recomendando-o a se adaptar às imposições sexuais do atual corpo encarnado).

Chico Xavier foi pioneiro dos "médiuns de direita" que apavoraram a opinião pública de esquerda, através dos relatos de Divaldo Franco, seu discípulo. Mas Chico era um direitista pior e mais radical que Divaldo, João de Deus e Robson Pinheiro, que se demonstraram alinhados com o golpe político de 2016. Outro suposto médium, Carlos Baccelli, afirmava que seu amigo Chico Xavier tinha horror doentio ao Partido dos Trabalhadores e sentia um enorme medo de ver Lula presidindo o Brasil.

Chico Xavier fez mal ao Espiritismo. Transformou o legado de Allan Kardec num verdadeiro chiqueiro (na ironia do trocadilho). Fez a Doutrina Espírita, em vez de andar para a frente pela racionalidade, andar para trás pelo obscurantismo.

Chico trouxe energias negativas profundas ao Espiritismo, tanto que muitos falam da "maldição dos filhos mortos", pois um considerável número de pessoas devotas dele, algumas famosas, viam seus filhos jovens morrerem de repente. Muitos afirmam que Chico Xavier exercia más energias, até naqueles que o viam como um "ser iluminado". Consta-se que uma foto com o "médium" olhando de frente, publicada em O Globo, em 1935, é apavorante: é como um ciclope olhando de frente, só que tendo dois olhos.

Ele arrasou com tudo. Até o mercado literário decaiu sob suas mãos, pois nosso mercado de livros é marcado por obras analgésicas, que fogem de qualquer necessidade real de obter o Conhecimento, a não ser por necessidades pragmáticas, como concursos públicos e ENEM.

Dizem que há um lobby da FEB com as editoras para evitar que títulos originais de Humberto de Campos fossem relançados. Quando houve uma oportunidade de relançar sua obra completa, e ainda assim só para celebrar os 80 anos de morte, em 2014, toda a obra foi lançada num único pacote, encarecendo demais o produto. Isso seria uma manobra para evitar que a verdadeira obra do escritor maranhense fosse apreciada e isso desmascarasse a obra "mediúnica".

A escola dos "médiuns" tornou-se um antro de pessoas desonestas e fraudulentas. Usa-se o morto que quiser, é só botar "mensagem cristã" e tudo bem. Vale tudo, de Redson do Cólera mandando mensagens piegas até Ricardo Boechat "arrependido" por ter sido ateu. Virou um "vale-tudo", com o agravante de que "acredita-se quem quiser" da "veracidade" ou não das "psicografias", o que representa uma grave ofensa à memória e ao legado dos falecidos, que não estão aqui para reclamar.

A farsa "mediúnica" já se define pela quantidade, estranhamente alta, de "médiuns" existentes no Brasil, e pela qualidade rasteira da totalidade de suas atividades, mesmo a partir dos "renomados" Chico e Divaldo, que também foram precursores do fenômeno dos "donos dos mortos", em que um morto possui um "médium" que se torna seu "proprietário", algo que vai contra as intruções de Allan Kardec.

Isso arruína todo o processo de comunicação com os mortos, que no Brasil nunca foi mais do que a raríssima das raridades. Os próprios mortos se afastam, horrorizados, do assédio de "médiuns" que lhes roubam os nomes, produzindo, sob a ajuda de terceiros, obras fake que carregam suspeito e tendencioso mershandising religioso, como se o mundo espiritual fosse uma grande igreja.

Daí que eu vejo o quanto as atividades "espíritas" são traiçoeiras e revelam uma religião sórdida - há, inclusive, o trocadilho da "sordidariedade", a cumplicidade a esse Espiritismo igrejeiro e medieval - e hipócrita, cujos "sacerdotes", os "médiuns", na prática se equivalem aos falsos profetas e aos antigos escribas fariseus e saduceus que Jesus Cristo reprovava, classificando-os de serem falsos sábios, mistificadores extravagantes e exploradores da fé religiosa.

Vejo o quanto "médiuns" e "não-médiuns", mas pregadores dessa "causa" neo-medieval a que se reduziu o Espiritismo no Brasil, não passam de pessoas fúteis e verdadeiros anões morais, que têm pressa para alcançar o Céu, o Reino dos Puros, enquanto fazem pouco caso se os sofredores perdem tempo numa encarnação enfrentando tsunamis de desgraças e overdose de adversidades. Querer conquistar o Céu às custas do sofrimento alheio é de causar nojo.

Eu trabalhei para a Editora Seda, de Alamar Régis Carvalho, que nunca me pagou um salário digno, só pagava o almoço. Fico pensando na reforma trabalhista, que Alamar não viveu para ver realizada - morreu a poucos meses do golpe de 2016 - , e me entristeço profundamente. Uma colega minha, que oferecia café na Editora Seda, falou que tinha que pedir dinheiro emprestado para cuidar da filha doente, porque o salário, sempre precário, não dava para a compra de remédios.

Eu vi o espalhafatoso José Medrado, feito um palhaço das palestras "espíritas", fazer piadas contra gordinhas e louras, para plateias de duzentas pessoas (que é o seu "fã-clube" em Salvador, não vai além disso, descontando alguns iludidos fora da capital baiana). Quanto às louras falsas, ridicularizadas pelo "médium", não consigo ficar sem pensar na Brittany Murphy, uma das pessoas mais admiráveis e talentosas que o mundo da fama nos mostrou nos últimos tempos.

Eu observei tanta sordidez, tanta hipocrisia, o quanto o Espiritismo brasileiro virou ninho de Judas Iscariotes ainda piorados, já que estamos na Semana Santa. Judas Iscariotes traiu Jesus Cristo uma única vez. Os "médiuns" e palestrantes "espíritas" (verdadeiros escribas fúteis da atualidade) traem Allan Kardec 25 horas por dia e oito dias por semana, mas não só fingem sentir fidelidade absoluta a ele como exigem dos outros o respeito doutrinário que não possuem.

Até mesmo os verdadeiros ensinamentos kardecianos, quando mencionados, são feitos da boca para fora. A desonestidade doutrinária faz do Espiritismo brasileiro uma religião pior do que as seitas neopentecostais, mas uma roupagem de falsa despretensão, falsa humildade e falsa caridade - expressa em práticas de Assistencialismo que lembram quadros do Caldeirão do Huck - que são glorificadas por muitos, mas sem que os resultados concretos fossem sequer mencionados (e eles são abaixo do medíocre).

Chico Xavier, aliás, foi um "filantropo" tão fajuto quanto Luciano Huck, seu admirador confesso. A "caridade" nunca foi obra do "caridoso" em questão, mas de terceiros, assim como Huck não mexe um níquel do seu bolso para "ajudar o próximo", apelando para seu público e seus patrocinadores fazerem o "trabalho". No caso do "médium", é constrangedor haver caravanas ostensivas que apenas davam uns reles donativos, que incluíam, em parte, pacotes de alimentos de baixa qualidade, roupas rasgadas ou manchadas e remédios com prazo de valdiade vencido.

Escrevo isso porque estou preocupado com o risco do Espiritismo se aproveitar das atuais crises vividas pelos brasileiros, como a do governo Jair Bolsonaro e a tragédia mundial do coronavírus. Fico preocupado, porque, em duas ocasiões, antes do golpe de 2016 e antes da vitória eleitoral de Bolsonaro, em 2018, foram manifestos textos de pessoas progressistas iludidas com Chico Xavier, que, se estivesse vivo, teria apoiado Jair Bolsonaro com muito gosto.

Eu gostaria que o legado de Allan Kardec tivesse sido respeitado. Infelizmente, ele é traído a todo tempo, pelos "espíritas" brasileiros que lhe fingem lealdade. Por isso, decidi romper totalmente com o Espiritismo brasileiro, e, em 30 de março de 2012, resolvi pular fora. Não volto mais a essa religião. Dessa "água fluidificada" não bebo mais. Ela está sempre contaminada.

Não adianta algum "espírita" falar que eu deveria "conhecer as obras assistenciais" ou ver, "sem compromisso", as reuniões onde "só se fala de Allan Kardec, só ele e Jesus". É como alguém que vê um homem curado do alcoolismo e resolve chamá-lo para tomar um chopinho. Prefiro ficar sem religião. Quando muito, sinto simpatia por católicos e evangélicos batistas. Mas o Espiritismo brasileiro, nunca mais.

Não confio sequer quando adeptos da "religião espírita" prometem "recuperar as bases doutrinárias". Claro que há exceções, mas são raríssimas (creio que só Sérgio Aleixo, Dora Incontri e algum outro similar). Mas na maioria dos casos, a promessa de "falar só de Kardec e Jesus" é algo comparável ao da fábula do sapo e do escorpião. Quem é que garante que ninguém vai falar de deturpação, sobretudo das ideias medievais de Chico Xavier?

A religião "espírita" tornou-se um umbral em toda sua essência. Isso se deve por conta dos atos desonestos que seus membros adotaram, sem o menor escrúpulo. Rompendo com essa religião, eu me livrei de um peso nas costas. Meus familiares continuam nela, mas espero não poder cair em mais uma armadilha. Prefiro ser um Ulisses preso no mastro do que cair em "cantos de sereia" perigosos, vindos não de moças bonitas, mas de "médiuns" feiosos, cuja feiura interior é mais horrenda ainda.

Abri os olhos e tive coragem de romper com a cegueira da fé obscurantista. Espero que você faça o mesmo. Abraços a todos.

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